Miguel Torga
Esta é a madrugada que eu esperava
Sophia de Mello Breyner Anderson

Mas não serão seguramente os jovens militares das FFAA, como nos tempos mais recentes alguns têm vindo a profetizar, os precursores dessas potenciais situações explosivas. As FFAA portuguesas, que há 35 anos ofereceram Abril aos Portugueses e ao Mundo, praticamente sem nada terem exigido em troca, vivem hoje em perfeita normalidade democrática e são um dos principais motivos de orgulho nacional e fonte de prestígio internacional do País. O seu contributo é inestimável para a organização de um mundo onde não domine o arbítrio ou a lei da força, mas onde as relações entre os povos se subordinem aos quadros multilaterais de onde emana o Direito Internacional Público (DIP). Tendo sempre bem presente que as armas dos militares pertencem ao povo, que lhas confia, e sua utilização processa-se no quadro democrático e constitucional interno, sem esquecer as missões internacionais legitimadas por aquele DIP. A própria luta anti-terrorista tem de ser considerada a esta luz e jamais poderá pôr em causa a ordem democrática interna, os direitos humanos ou os princípios fundamentais da democracia. Penso que o contributo, passado e presente, das FFAA para trazer os valores de Abril para o século XXI não carece de outros sublinhados.
6.ª Palavra: Pátria

É que a questão de fundo, aquela que verdadeiramente importa, é a seguinte: são precisos bons patriotas que saibam renovar e afirmar os valores permanentes de Portugal, “cumprir Portugal” – como queria Fernando Pessoa, reinventando os espaços de cidadania. Para fazer de Portugal, como se diz no preâmbulo da nossa Constituição, “…um país mais livre, mais justo e mais fraterno…”, é preciso preservar o nosso património comum, renovar a cidadania e afirmar sem complexos o orgulho de ser português.
7.ª Palavra: Futuro

Quanto à solidariedade, penso que esta deverá hoje ser orientada para aqueles que, perdendo o emprego, sofreram uma redução inesperada dos seus rendimentos e que travam uma luta diária pela sobrevivência face ao risco de pobreza e exclusão social. Neste sentido, Abril consistirá em melhorar a vida dos desempregados involuntários, dos “pobres envergonhados”, dos que não conseguem suportar os encargos básicos da educação dos filhos e da prestação da casa.
Por outro lado, pressupõe igualmente o combate à corrupção, às “dinastias republicanas”, à alternância sem alternativa, ao conformismo, ao enriquecimento ilícito, ao mero poder do dinheiro. As pessoas sentem-se vinculadas ao seu Estado na medida em que com ele se relacionem numa perspectiva de retorno do esforço que lhes é exigido, beneficiando dos direitos que decorrem do contrato social. E isso implica restaurar a sociedade da confiança.

Dos famosos “3 D’s” preconizados por Abril como pressupostos da Liberdade (Descolonização; Democratização; Desenvolvimento), diria que se o primeiro foi integralmente cumprido, o segundo é de per si uma tarefa inacabada e, quanto ao terceiro – o Desenvolvimento –, tomando por referência a média europeia, permanece como um desígnio em torno do qual importa concentrar esforços. O desafio do Desenvolvimento pressupõe sempre um combate ao status quo, ao corporativismo e à especulação financeira, que nada acrescenta à economia real ou à qualidade de vida das pessoas.
Quase todos se lamentam dos políticos que temos mas muito poucos se propõem como alternativa ou combatem os que acham corruptos ou incompetentes. Quase todos desprezam os intelectuais que temos, os professores, os dirigentes, os artistas, os escritores, quando, na verdade, precisávamos era de bons portugueses, lideres oriundos das várias elites públicas e privadas que compõem a sociedade, desde que com percursos de vida seriamente estruturados e norteados por uma ética de trabalho, de esforço e de mérito próprio.
Há líderes que escravizam e líderes que libertam. Salgueiro Maia, que não perguntou aos portugueses se queriam ser livres – tal como não se pergunta a quem tem sede se quer água -, devolveu-nos esse valor que há muito tínhamos perdido. E, paradoxo da natureza humana e das instituições sociais, a própria Liberdade se encarregou de que por isso pagasse um elevado preço. Para Fernando Salgueiro Maia a Liberdade nunca foi gratuita. Coisa que ele próprio já saberia.
Eurico Manuel Curates Rodrigues
Doutorando em Relações Internacionais
Auditor de Defesa Nacional
Auditor de Política Externa Nacional
1 comentário:
Caro Eurico,
Não posso deixar de te congratular pela oportunidade e, sobretudo, o conteúdo do artigo.
Sem dúvida uma excelente demonstração de assertividade e liberdade de pensamento.
É sempre bom comprovar que "há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não".
Um abraço,
Pedro Barosa
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