Também nesta matéria o programa do eleitoral do Partido Socialista é claro. Nele se confirmar a preocupação política dada a esta matéria, sublinhando-se a necessidade do reforço dos instrumentos para a internacionalização e uma coordenação mais acentuada de tais instrumentos.
Igualmente se reitera a importância da captação de investimento externo, que deve continuar a ser uma prioridade nacional, bem como um novo olhar às parcerias com o “empresariado da diáspora portuguesa”.
É patente neste documento a afirmação de que “o novo impulso a dar à internacionalização da economia portuguesa deve assumir-se como a prioridade da acção externa do Estado português”.
Contudo, importa ter presente o que pressupõe a diplomacia económica para um país como Portugal, na actual conjuntura internacional.
Sem prejuízo da estabilidade verificada ao nível dos eixos de intervenção e das prioridades estratégicas da política externa nacional, as profundas transformações ocorridas no sistema internacional reforçaram a urgência da reorganização do nosso modo de implantação no exterior.
É neste contexto internacional, em que os Estados assumem um papel mais interventivo, que a diplomacia económica, enquanto instrumentos impar na acção externa do Estado, ganha acrescida relevância, assumindo um papel fundamental na internacionalização da economia portuguesa e na captação de investimento directo estrangeiro.
O modo como os Estados passaram a perspectivar a diplomacia económica, teve como consequência lógica a mudança de paradigma em que assentavam, desde logo, as suas máquinas diplomáticas. Assim, assiste-se à mudança do perfil do diplomata, adaptando-o aos novos “tempos”. As suas tarefas já não se circunscrevem à participação em negociações em organismos internacionais, passando as preocupações económicas a fazer parte integrante da diplomacia moderna.
Surgem assim novas competências para a actividade diplomática que se traduz, nomeadamente: na alteração do paradigma comunicacional, tornando a diplomacia mais “transparente”, necessidade de uma maior coordenação inter-ministerial, bem como um maior esforço de articulação entre actores muito distintos; uma maior capacidade de englobar “visões” de actores não estatais na política externa; e uma maior especialização temática, sobretudo em áreas económicas.
A lógica em que assenta o paradigma diplomático português, tal como em muitos outros países, consolidado em torno do Ministério do Negócio Estrangeiro encontra-se, em certa medida desajustado, uma vez que o Estado deixou de ser “o” actor na cena internacional, para ser mais um, embora mantendo um estatuto privilegiado. Daí a necessidade de repensar e flexibilizar as das estruturas estatais.
Mais do que nunca, Portugal deve repensar a sua rede diplomática e consular, e proceder, sempre que necessário e de uma forma ágil, ao respectivos ajustamentos garantindo uma efectiva adequação aos novos desafios, realidades e objectivos da diplomacia, em que os Estados são cada vez mais colocados em posições negociais face a outros parceiros. No entanto, o esforço exigido ao corpo diplomático deverá ser ombreado com o dos restantes actores e agentes económicos, bem como o de todos restantes sectores do Estado neste domínio.
Em Portugal, o modelo de diplomacia económica é recente, tendo apenas sido formalizado em 2003, datando a sua última alteração de 2006, a qual traduz a opção de neste domínio consagrar uma dupla tutela partilhada entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Ministério da Economia e da Inovação.
Com efeito, é nos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Economia e Inovação que a diplomacia económica portuguesa é essencialmente gizada, apesar de se poder constatar que a diplomacia nacional continua fragmentada sectorialmente na sua intervenção.
No entanto, o presente modelo tem vindo a reforçar a apoio à internacionalização das empresas portuguesas, valorizando a vertente económica no funcionamento das embaixadas e consulados, tendo no âmbito do Ministério dos Negócios Estrangeiros sido criada a Direcção-Geral dos Assuntos Técnicos e Económicos que marca uma clara viragem na sua concepção “estato-centrica”, traduzindo assim a preocupação política com a dimensão económica da diplomacia.
Até hoje pouco explorada de forma integrada, afigura-se que a componente regional poderia ser desenvolvida no quadro da diplomacia económica, nomeadamente através da maior ligação às Câmaras de Comércio.
Sem prejuízo de a actual arquitectura institucional continuar a apresentar lacunas que se repercutem necessariamente na acção externa do Estado português, os sinais de definição clara de competências e de coordenação permitem-nos, neste domínio, antever uma inversão na tendência de criação de um número infindável de instituições com actividades complementares.
Porém, o modelo em apreço apresenta desde já algumas lacunas, em particular aos nível: da intersecção entre o domínio de assuntos políticos e da análise económica para informar decisões e orientações de política externa; do controle da execução dos planos de negócios projectados; da dinâmica de avaliação nos serviços técnicos e políticos dos ministérios; do enraizamento de actividades e perfis económicos na carreira diplomática; da formação económica no seio da carreira diplomática; do perfil profissional do diplomata não estar ligado a áreas do conhecimento económico; e do estatuto de carreira de adido económico/ comercial.
Estas lacunas têm necessariamente repercussões ao nível da implementação do modelo de diplomacia gizado, em especial na sua eficiência e eficácia.
O reconhecimento da importância do papel que a diplomacia económica desempenha enquanto instrumento de política externa é hoje consensual no espectro político e académico nacional. Contudo, a questão que se coloca é até onde se poderá alavancar este instrumento na acção externa dos Estados e quais serão consequentes implicações na visão de uma nova diplomacia do século XXI, tendo em especial atenção que a mudança de paradigma está fortemente condicionada à visão do próprio corpo diplomático.
Fernando Montenegro
Auditor de Política Externa Nacional
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