Cascais acolheu no passado dia 4 de Maio mais um debate promovido pelo Clube de Reflexão Política - A Linha. O tema escolhido, da maior actualidade, teve como oradores convidados o Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, José António Vieira da Silva e o Secretário de Estado da Segurança Social, Pedro Marques, que partilharam generosamente com o auditório, a sua visão sobre Os Desafios do Crescimento Económico.
Após ter sido feita a apresentação do vasto currículo dos oradores, o moderador, Fernando Montenegro, abriu o debate dando, desde logo, a palavra ao Ministro da Economia, que começou por submeter à reflexão de todos os presentes os três grandes desafios com que a nossa economia se defronta (segundo uma ordem que não é de importância relativa, referiu):
- Em primeiro lugar, o de acelerar a recuperação económica, salientando o quadro de crise que vivemos com a recessão mundial dos anos 2008/2009.
- Um segundo desafio, de médio/longo prazo, o da modernização da economia, que possibilite um crescimento sustentado.
- Por último, o equilíbrio das contas públicas.
No entanto, Vieira da Silva considerou ser extremamente difícil a conciliação destes três objectivos, designadamente do ponto de vista da execução das políticas, dado que têm vertentes potencialmente contraditórias ao nível dos instrumentos a utilizar.
Quanto ao primeiro, o da recuperação económica, Vieira da Silva destacou a gravidade da recente crise global, a pior que a economia do Mundo viveu em tempo de paz, desde a profunda recessão que marcou os anos 20/30 do século XX. Lembrando as consequências que daí advieram para uma economia aberta como a portuguesa, o Ministro da Economia passou à avaliação do posicionamento do país em face deste desafio. Tendo em vista a imperativa necessidade de suscitar um impulso dirigido à retoma do investimento e da criação de emprego, apontou como aspecto em nosso favor o facto de a recessão ter sido menos dura em Portugal do que noutros países da Europa (em média 4, 1 % na Europa e apenas 2, 6 % em Portugal), assim como os rápidos e surpreendentes sinais de recuperação da economia que surgiram logo após as más notícias da crise global, em particular ao nível das exportações. Como factores negativos, referiu a actual incerteza nos mercados, com a continuação das restrições ao nível da concessão de crédito, sem que se vislumbrem indicadores convincentes no que toca à recuperação da economia europeia. Fez ainda, Vieira da Silva, juntar a esse ponto, as dificuldades de curto prazo que resultam das exigências associadas a um processo de consolidação das contas públicas, obrigando os Estados a fazer uma política orçamental mais restritiva.
Passando ao desafio da modernização, o Ministro Vieira da Silva apontou-o como indispensável, porquanto a nossa economia se mantém estruturalmente deficitária do ponto de vista externo. Este vector que no seu entender tem funcionado sempre como uma espécie de “guilhotina” sobre a nossa capacidade de crescer, ganha expressão ainda mais relevante numa união económica e monetária. Neste sentido, identificou duas vias para o desenvolvimento estrutural que estão presentemente em curso: a redução do deficit energético, com o tradicional peso significativo no nosso deficit comercial e a alteração do modelo de especialização económica do país, outrora baseado nos baixos custos de produção, hoje progredindo no sentido da tecnologia e inovação.
Justificando com os presentes ataques especulativos à zona euro a necessidade de levar por diante o desafio de consolidação das contas públicas, o orador convidado chamou a atenção para a exigência de credibilidade nas estratégias de correcção, tendo invocado as provas de capacidade que Portugal já deu nessa matéria, nomeadamente com a reforma da segurança social encetada na legislatura anterior. Vieira da Silva concluiu a sua fala apostando na internacionalização ganhadora da nossa economia, como pedra de toque de todos os três desafios que referiu e perspectivou um equilíbrio mais sustentado das contas públicas num futuro que pertencerá às novas gerações, para o que se fez apoiar nos recentes sinais positivos que têm surgido do lado das exportações.
Por seu turno, o Secretário de Estado da Segurança Social propôs-se fazer uma abordagem ao tema que viesse em complemento da que foi produzida pelo orador anterior, referindo-se para tanto a três áreas políticas em concreto: qualificação e formação, reforma da segurança social e reforma das relações laborais.
Relativamente à primeira, considerada central para o crescimento do país a longo prazo, Pedro Marques referiu o esforço que o governo tem levado a efeito no sentido de reforçar a qualificação de base dos nossos recursos humanos, ao mesmo tempo que, em paralelo, promoveu o combate ao abandono e insucesso escolar, mencionando ainda o reforço do quadro tecnológico do ensino, o alargamento da escolaridade obrigatória e o programa novas oportunidades, considerando ser este um instrumento poderosíssimo na recuperação dos nossos níveis de qualificação.
No que concerne à reforma da segurança social, Pedro Marques apontou a acertada opção do governo em fazer um ajustamento progressivo do sistema à realidade do envelhecimento da população, permitindo deste modo a obtenção de um equilíbrio numa área que antes oferecia risco de insustentabilidade - com a ameaça de desvio de recursos necessários para o financiamento da actividade económica e de aumento de impostos -, e deste modo favorecendo o crescimento sustentado da nossa economia.
Finalmente, o orador referiu a regulação das relações laborais, com ênfase para a negociação colectiva, tendo chamado a atenção para o novo paradigma de adaptabilidade negociada nas empresas, em oposição à flexibilidade externa e aos despedimentos individuais. Neste novo modelo, a utilização dos instrumentos legais que permitem a adaptação das empresas e dos trabalhadores à realidade económica que estão a viver - ex. bancos de horas, horários concentrados, adaptabilidade grupal -, é negociada com os representantes dos trabalhadores ou os próprios trabalhadores, de acordo com os mecanismos legalmente previstos.
Ainda como solução tendente à defesa do emprego nas empresas, o Secretário de Estado da segurança Social mencionou a possibilidade de negociação das dívidas à segurança social - instrumento que está na agenda do governo e que permitirá duplicar os respectivos prazos máximos de pagamento – tendo feito ainda referência à susceptibilidade de redução das suas taxas de juro mediante a apresentação de garantias efectivas, assim se evitando pôr em risco a subsistência das empresas e do emprego, sem abdicar das receitas do sistema de protecção social. Aludiu ainda às diversas alterações nas regras de atribuição do subsídio de desemprego, que o governo irá promover, seguindo uma lógica de reforço da empregabilidade, prevendo-se nomeadamente um combate mais eficaz à fraude, tanto da parte de trabalhadores, como da parte das empresas (que ofereçam postos de trabalho em condições que se verifique desrespeitarem o compromisso da oferta formulada).
Finalmente, o orador abordou a questão do combate às desigualdades, como justa repartição dos ganhos provenientes do crescimento económico, dois desafios importantes cujo fim último é aumentar o bem-estar da sociedade.
A estas intervenções seguiu-se um participado debate. Entre as questões abordadas foi dado especial enfoque nomeadamente à importância da definição estratégica das políticas económicas, a importância da regulação dos mercados, cuja definição e implementação tarda em acontecer.
Esta troca de ideias manteve aceso o debate até já perto da meia-noite, tendo sido necessário dá-lo por encerrado, não sendo assim possível dar a palavra a muitos dos presentes de modo a formularem outras questões. No entanto, ficou a promessa por parte dos oradores de um regresso ao Clube A Linha.
1 comentário:
Apenas estabelecendo pontes entre a reflexão e a acção políticas será possível à Esquerda superar arquétipos teóricos incapazes de responder aos novos desafios do país. Foi este tipo de contributo que, mais uma vez, A LINHA procurou dar, combinando a análise sócio-económica rigorosa e inovadora com a elegância do ambiente em que decorreu a sessão. Parabens! Eurico Rodrigues.
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